20/07/2011

Por um Ipea para a educação

Por um Ipea para a educação
Jornal da Ciência, de 12 de Julho de 2011
Artigo de Luciano Mendes de Faria Filho enviado o JCE-mail.

Recentemente a imprensa nacional divulgou, com grande destaque, o resultado de uma pesquisa realizada pelo Ipea em que se chegou à conclusão de que as reformas dos aeroportos brasileiros não ficarão prontas antes do final da copa do mundo de 2014. Imediatamente após a divulgação do estudo, várias autoridades, incluindo ministros, vieram a público afirmar que as conclusões do estudo não estavam corretas e as obras de infraestrutura para a copa seriam levadas a bom termo antes do mundial. No entanto, mesmo diante das negativas dos órgãos do governo, os pesquisadores do Ipea, fiéis a uma tradição de independência em relação ao governo, mantiveram as conclusões do estudo realizado.
Este episódio, dentre outros, ilustra bem a posição de órgão de Estado, e não de governo, conquistada pelo Ipea, uma das mais importantes e profissionalizadas instituições de estudos estratégicos do Brasil. Pois bem, levando em consideração sua importância estratégica e a complexidade da educação como serviço público de responsabilidade estatal, será que não deveria ter, a educação, um órgão do porte do Ipea para a realização de pesquisas e estudos estratégicos que subsidiassem os órgãos de Estado em suas tomadas de decisões sobre o tema?
Hoje, de um modo geral, apesar da importância estratégica da educação e da complexidade deste que é, de longe, o maior serviço público de responsabilidade estatal no Brasil, praticamente não há estudos mais largos e com uma mirada temporal mais ampla em educação no Brasil. A quase totalidade dos estudos é realizada nos programas de pós graduação em educação e em alguns poucos centros de pesquisa que se dedicam ao tema. Num e noutro caso, quase sempre as pesquisas e estudos estão submetidos aos condicionamentos dos financiamentos de curto prazo e, não menos importante, aos modelos de consagração próprios do campo acadêmico.
Sabemos que a existência de conhecimentos que subsidiem as decisões a respeito das políticas de Estado sobre a educação não garante que as decisões os levarão em conta. No entanto, a inexistência dos mesmos, é uma certeza de que os tais decisões continuarão sendo tomadas de forma amadora e excessivamente ideologizada, não permitindo que possamos fazer planejamentos minimamente consistentes e de médio e longo prazos como demanda este complexo e importante serviço público.
Muitos dos meus colegas da área de educação acham que tal posição estratégica pode vir a ser cumprida, mais uma vez, pelo INEP. Eu tenho minhas dúvidas. Desviado de sua missão inicial, sobretudo a partir do início dos anos de 1990, o órgão passou a ser mero apêndice do Ministério da Educação, executor de políticas e ações de curo prazo. Neste processo, seu corpo técnico e de investigadores foi desprestigiado, quando não simplesmente desmantelado. Tudo isto resultou num órgão com baixíssima capacidade de realização de estudos estratégicos e tornou-se totalmente sujeito às vicissitudes das ações e opções políticas dos ocupantes dos ocupantes do Ministério da Educação, o que levou, nas última décadas, a uma mais que indesejável mudança constante em sua direção máxima.
Assim, para vir a ocupar este lugar de órgão de Estado, o INEP retome a missão que lhe foi confiada quando de sua criação, em 1939: uma instituição independente e profissionalizada que teria como escopo fundamental de sua ação a realização de estudos estratégicos que subsidiasse as tomadas de decisões políticas e não, como é hoje, um órgão operacionalizador de políticas de governo.
No entanto, cabe perguntar: seriam os ocupantes do Ministério e de suas Secretarias capazes de abrir mão de um INEP frágil e sujeito às vicissitudes das políticas de governo, para dotá-lo de um corpo técnico e científico independente, qualificado e profissionalizado? Seria o corpo técnico-científico do INEP capaz de se reinventar e retomar, também reinventando, uma rota há muito perdida? Uma resposta positiva a estas duas questões significaria, sem dúvida, um gesto inteligente e consequente de nossos dirigentes e uma decisão de grande relevância para a educação brasileira.

Luciano Mendes de Faria Filho é professor de História da Educação da UFMG, Coordenador do Projeto Pensar a Educação, Pensar o Brasil-1822/2022.
Fonte:  http://www.jornaldaciencia.org.br/Detalhe.jsp?id=78359

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